Credo quia absurdum (Creio porque é absurdo)
Publicado: 11/04/2009 por Antonio Ozaí da Silva em religião e sociedadeFiéis se autoflagelam enquanto rezam em frente a uma imagem de Jesus Cristo na cidade de Angeles, ao norte de Manila (Filipinas), durante ritual que integra as comemorações da Semana Santa (Romeo Ranoco/Reuters)
“Imagine there’s no countries
It isn’t hard to do
Nothing to kill or die for
And no religion too”
(John Lennon)
No tempo em que viajava para fazer o doutorado, assisti a um filme no ônibus. Não recordo o título, nem o final. Dormi antes de acabar. Ficou na memória um diálogo entre os personagens: o índio, que viera à cidade para estudar, é interpelado pelos colegas, os quais ironizam sua crença em divindades vinculadas à natureza. Em resposta, ele questiona a fé deles num homem nascido de uma virgem, morto, ressuscitado e elevado ao céu. Se assim acreditam, que direito têm de zombarem?
Outros crêem que serão arrebatados, isto é, que Jesus voltará à terra e levará os escolhidos, em corpo e alma, para o paraíso. Será o encontro do Senhor com a Sua Igreja, o noivo com a sua noiva. Mas qual será “a” Igreja? Com tantas por aí, cada uma se considerando mais “verdadeira” que a outra, a tarefa do Senhor não será fácil.
Isso me faz lembrar a pregação do bispo na crisma da minha filha. Bem-humorado, perguntou aos presentes, a maioria jovens, com seus pais e mães corujas, quem queria ir para o céu. Todos levantaram a mão e ainda bem que ninguém prestou atenção ao redor! Então, ele disse: “Quem quer ir para o céu, AGORA?” Só alguns, os mais fervorosos ou talvez por não entenderem bem a fala bispal, ergueram os braços. O bispo brincou e continuou o sermão, fundamentado em São Paulo, sobre as tentações da carne e os cuidados para a salvação do espírito. Uma tentativa de controlar o vigor juvenil com os hormônios à flor da pele.
Há quem creia que ao morrer terá várias virgens à sua disposição. Prá quê? O que um corpo morto pode fazer? Ah!, claro, o indivíduo também deve acreditar que subirá aos céus em corpo e alma. Mas sentirá os prazeres da carne? Em todos os credos, do mais primitivo ao moderno, os absurdos acumulam-se. Acredita-se em coisas que até mesmo Deus duvida! Convido o leitor a ver as imagens em http://picasaweb.google.com/antoniozai/ReligioneIrracionalismoEIntolerantia?feat=directlink. Leia as legendas com atenção, observe bem as fisionomias e as atitudes dos fiéis e tire as próprias conclusões.
O perigo é quando o absurdo das crenças se manifesta em formas de intolerância entre elas e contra os que não professam o Credo quia absurdum. Cristãos não se entendem, mulçumanos também não e os judeus têm os seus fundamentalistas. Não obstante, os absurdos são a matéria da fé e fonte das suas vidas.
As manifestações religiosas são uma constante no imaginário das sociedades humanas, desde os povos considerados mais primitivos. Estamos acostumados a pensar em termos monoteístas e desconhecemos a diversidade das divindades e crenças de outros povos, as quais resistem ao passar do tempo. Essa permanência indica que a religião é inerente ao humano?
Somos seres racionais, mas também plenos de desejos e imaginação. O humano é um ser cultural que cria símbolos, referências para a sua caminhada, o seu estar no mundo. Ele, portanto, não se reduz à racionalidade. Necessita da experiência religiosa, ainda que aos incrédulos seja absurdo. Para o crente, não importa o que a razão e a ciência afirmem. Ele acredita, e ponto final!
Admiro as pessoas que têm fé. Maravilham-me ainda mais por acreditarem em absurdos. Elas são o mistério da fé. A frase Credo quia absurdum, atribuída a Tertuliano, expressa bem o significado da crença. Simplesmente acreditam! Não adianta argumentos racionais e fatos comprovados cientificamente. A razão é impotente diante da fé. Por mais que consideremos o credo como “absurdum”, devemos respeitá-lo e tentar compreender. Afinal, é também manifestação da humanidade que nos faz semelhantes.
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